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Pagu tem os olhos moles, uns olhos de fazer doer. Bate-coco quando passa, Coração pega bater. Eh Pagu eh! Dói porque é bom de fazer doer”
Coco de Pagu, Raul Bopp

Patrícia Rehder Galvão, conhecida pelo pseudônimo de Pagu, nasceu em São João da Boa Vista em 9 de junho de 1910. Poeta, romancista, crítica, cronista, ilustradora, autora teatral e mais do que isso: Patrícia Galvão foi acima de tudo revolucionária. Numa época em que as mulheres andavam de cabeça baixa nas ruas, ela com 17 anos, pintada, de saia curta, blusa transparente, cabelos despenteados, cigarro na boca e andar despreocupado, Pagu erguia o olhar e soltava palavrões aos estudantes da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, que a provocavam.
Aos 18 anos, freqüentava o ambiente contestatório do movimento antropofágico, comandado por Oswald de Andrade. Estreou na Revista de Antropofagia, em sua fase mais radical, a nº 2, chamada “segunda dentição”, em meio a pessoas como Raul Bopp, Oswaldo Costa, Geraldo Ferraz e Fernando Medeiros de Almeida. Aos 20 anos, viajou à Buenos Aires-Argentina, onde encontrou o líder comunista Luís Carlos Prestes e conheceu Jorge Luís Borges.
De acordo com seu biógrafo Augusto de Campos, o apelido Pagu foi dado pelo poeta Raul Bopp, quando Patrícia lhe mostrou alguns poemas. Bopp sugeriu que ela adotasse um nome literário feito com primeiras sílabas de seu nome e sobrenome: Pagu. Foi um engano de Bopp, pensando que a moça se chamasse Patrícia Goulart. Mas ele escreveu um poema para ela, O coco de Pagu, e o apelido pegou.

Em 1930 Oswald separou-se de Tarsila e se casou-se com Pagu que estava grávida de seu primeiro filho, Rudá de Andrade, nascido no mesmo ano. De volta ao Brasil (1931), filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e passou a redigir a seção "A Mulher do Povo", no jornal O Homem do Povo, que editou com Oswald de Andrade. Nos textos, criticava o feminismo proposto pela burguesia. Como militante do PCB, depois de erguer do chão um cadáver de um estivador negro morto pela polícia durante a greve dos estivadores em Santos, foi levada à cadeia (1931) acusada de promover agitações. Esta foi a primeira vez na História do Brasil que uma mulher foi presa por motivos políticos. Em liberdade, prosseguiu sua militância.
Trabalhou como lanterninha num cinema; protegeu os oradores nos comícios e reuniões do partido; lançou o romance proletário Parque Industrial (1933), sob o pseudônimo de Mara Lobo; e saiu em viagem pelo mundo, enviando correspondências para o Diário de Notícias e Correio da Manhã. Em Paris, conviveu com os surrealistas Aragon, André Breton, Paul Eluard, Benjamin Péret e René Crevel e freqüentou a Université Populaire, tendo cursos com Marcel Prénalt, Politzer e Paul Nizan. Após ser ameaçada de deportação por ter militado no PC francês com identidade falsa, em 1935 retornou ao Brasil e à cadeia. Em liberdade, rompeu definitivamente com o partido, voltou a trabalhar como jornalista, escrevendo na revista Vanguarda e Socialismo e no Diário de São Paulo, e lançou seu segundo livro, A Famosa Revista. Estava muito doente, arrasada, e pesava 44 quilos - tentou suicídio ao ser libertada.
No ano seguinte, casada com o jornalista Geraldo Ferraz, teve seu segundo filho, Geraldo Galvão Ferraz. Trabalhou nos jornais cariocas "A Manhã", "O Jornal", e nos paulistanos "A Noite" e "Diário de São Paulo". Com o pseudônimo de King Shelter, escreveu contos de suspense para a revista "Detetive", dirigida pelo dramaturgo Nelson Rodrigues.
Voltou a tentar suicídio, em 1949. Nos anos seguintes, foi crítica literária, teatral e de televisão no jornal "A Tribuna", de Santos. Nessa cidade, liderou a campanha para a construção do Teatro Municipal, além de fundar a Associação dos Jornalistas Profissionais. Também criou a "União do Teatro Amador de Santos", por onde passariam os novatos Aracy Balabanian, José Celso Martinez Correa, Sérgio Mamberti e Plínio Marcos.
Pagu voltou a Paris em setembro de 1962, para ser operada de câncer. A cirurgia não teve êxito e ela tentou suicídio novamente. Muito doente, viveu até dezembro. Na véspera de sua morte, um último texto seu é publicado em "A Tribuna", o poema "Nothing".




Parque Industrial
Edição particular - 1933

Romance de estréia de Patrícia Galvão, teve a edição paga por Oswald de Andrade. É o primeiro romance proletário da literatura brasileira, ou seja, que tinha como tema personagens, problemática e ambientação ligados à classe operária. É um contraponto ao chamado romance de 30, de autores como Jorge Amado e Rachel de Queiroz, entre outros, na exploração dos aspectos da vida do povo em meio a transformações sociais. O romance, usando recursos expressivos modernistas, tem influência do estilo de Oswald. É um painel abrangendo as interações de personagens de classe operária e de outros de classe média alta. A vida na fábrica, nos cortiços do bairro paulistano do Brás, são o cenário de pequenos dramas quotidianos centralizados no amor, no sexo e no dinheiro.
"Parque Industrial" foi lançado nos Estados Unidos, em traducão de K. David Jackson, no ano de 1994. A editora foi a University of Nebraska Press.

Alguns Poemas:

CANAL
Publicado n'A Tribuna, Santos/SP, em 27-11-1960
Nada mais sou que um canal
Seria verde se fosse o caso
Mas estão mortas todas as esperanças
Sou um canal
Sabem vocês o que é ser um canal?
Apenas um canal?

Evidentemente um canal tem as suas nervuras
As suas nebulosidades
As suas algas
Nereidazinhas verdes, às vezes amarelas
Mas por favor
Não pensem que estou pretendendo falar
Em bandeiras
Isso não

Gosto de bandeiras alastradas ao vento
Bandeiras de navio
As ruas são as mesmas.
O asfalto com os mesmos buracos,
Os inferninhos acesos,
O que está acontecendo?
É verdade que está ventando noroeste,
Há garotos nos bares
Há, não sei mais o que há.
Digamos que seja a lua nova
Que seja esta plantinha voacejando na minha frente.
Lembranças dos meus amigos que morreram
Lembranças de todas as coisas ocorridas
Há coisas no ar...
Digamos que seja a lua nova
Iluminando o canal
Seria verde se fosse o caso
Mas estão mortas todas as esperanças
Sou um canal.
UM PEIXE

Um pedaço de trapo que fosse
Atirado numa estrada
Em que todos pisam
Um pouco de brisa
Uma gota de chuva
Uma lágrima
Um pedaço de livro
Uma letra ou um número
Um nada, pelo menos
Desesperadamente nada.
NOTHING
Publicado n'A Tribuna, Santos/SP, em 23/09/1962
Nada nada nada
Nada mais do que nada
Porque vocês querem que exista apenas o nada
Pois existe o só nada
Um pára-brisa partido uma perna quebrada
O nada
Fisionomias massacradas
Tipóias em meus amigos
Portas arrombadas
Abertas para o nada
Um choro de criança
Uma lágrima de mulher à-toa
Que quer dizer nada
Um quarto meio escuro
Com um abajur quebrado
Meninas que dançavam
Que conversavam
Nada
Um copo de conhaque
Um teatro
Um precipício
Talvez o precipício queira dizer nada
Uma carteirinha de travel's check
Uma partida for two nada
Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas
Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava
Um cão rosnava na minha estrada
Um papagaio falava coisas tão engraçadas
Pastorinhas entraram em meu caminho
Num samba morenamente cadenciado
Abri o meu abraço aos amigos de sempre
Poetas compareceram
Alguns escritores
Gente de teatro
Birutas no aeroporto
E nada.

Alguns artigos e textos feitos sobre Pagu:
Aalma que não se vende- Lúcia Maria Teixeira Furlani.
Patrícia Galvão- Alfredo Mesquita.
Uma Grande Mulher- Moacyr Scliar.
Imagens de Perda- Carlos Drummonde de Andrade.
Para saber mais: www.pagu.com.br
(Sandriane Dias é graduanda do 4° ano de Letras/ Literatura da UFMT e compõe a atual gestão do DCE “ Não há mal que não se mude!”
email: sandrianemrs@gmail.com)

2 Comentario para DOMINGO LITERÁRIO OCT: Patrícia Galvão - Pagu

14 de julho de 2008 às 13:37

A Pagu é massa!!!!

Baita mulher! Foi comunista numa época em que isso valia a pena. Trouxe-nos as primeiras sementes de soja. Foi casada com 2 caras phodidões da literatura brasileira. Teve até um filme feito pela Norma Bengel!

Ae Sandriane
PARABÉNS, de novo, pela matéria!
e pelos anos de vida!!!

abração.

15 de julho de 2008 às 12:27

Obrigada!!

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