COLUNA ALTERNATIVA: "O PERAMBULAR DE UM FANTASMA: A DESIGUALDADE" por Edson Santana



A Coluna está de volta! Uma das suas missões cumpridas foi a postagem do Capítulo I (em três partes) da monografia de Edson Santana. Continuando a saga, postaremos nas próximas semanas o capítulo II!

CAPÍTULO I

"O PERAMBULAR DE UM FANTASMA: A DESIGUALDADE

A VIOLÊNCIA TRAVESTIDA FAZ SEU TROTTOIR


1. no ar que se respira, nos gestos mais banais
2. em regras, mandamento, julgamentos, tribunais
3. na vitória do mais forte, na derrota dos iguais

4. a violência travestida faz seu trottoir

5. na procura doentia de qualquer prazer
6. na arquitetura metafísica das catedrais
7. nas arquibancadas, nas cadeiras, nas gerais

8. a violência travestida faz seu trottoir

9. na maioria silenciosa, orgulhosa de não ter
10. vontade de gritar, nada pra dizer
11. a violência travestida faz seu trottoir
12. nos anúncios de cigarro que avisam que fumar faz mal

13. a violência travestida faz seu trottoir
14. em anúncios luminosos, lâminas de barbear
15. armas de brinquedo, medo de brincar
16. a violência travestida faz seu trottoir

17. no vídeo, idiotice intergaláctica
18. na mídia, na moda, nas farmácias
19. no quarto de dormir, na sala de jantar
20. a morte anda tão viva, a vida anda pra trás
21. é a livre iniciativa, igualdade aos desiguais
22. na hora de dormir, na sala de estar

23. a violência travestida faz seu trottoir

24. uma bala perdida encontra alguém perdido
25. encontra abrigo num corpo que passa por ali
27. e estraga tudo, enterra tudo, pá de cal
28. enterra todos na vala comum de um discurso liberal

29. a violência travestida faz seu trottoir
30. em anúncios luminosos, lâminas de barbear
31. armas de brinquedo, medo de brincar
32. a violência travestida faz seu trottoir

33. a violência travestida faz seu trottoir
34. em anúncios luminosos, lâminas de barbear
35. armas de brinquedo, medo de brincar
36. a violência travestida faz seu trottoir

37. Tudo que ele deixou foi uma carta de amor pra uma
38. apresentadora de programa infantil. Nela, ele dizia que
39. já não era criança, e que a esperança também dança
40. como monstros de um filme japonês. Tudo que ele tinha
41. era uma foto desbotada, recortada de revista
42. especializada em vida de artista. Tudo que ele queria era
43. encontrá-la um dia (todo suicida acredita na vida depois
44. da morte). Tudo que ele tinha cabia no bolso da jaqueta.
45. A vida, quando acaba, cabe em qualquer lugar.
46. E a violência travestida faz seu trottoir...

47. não se renda às evidências
48. não se prenda à primeira impressão

49. eles dizem com ternura:
50. “o que vale é a intenção”
51. e te dão um cheque sem fundos
52. do fundo do coração

53. no ar que se respira
54. nessa total falta de ar
55. a violência travestida
56. faz seu trottoir

57. em armas de brinquedo, medo de brincar
58. em anúncios luminosos, lâminas de barbear
59. nos anúncios de cigarro que avisam que fumar faz mal

60. a violência travestida faz seu trottoir
61. a violência travestida faz seu trottoir


Neste capítulo, analisamos o poema “A violência travestida faz seu trottoir”, do disco O papa é pop, de 1990. Naqueles idos, o Brasil tinha seu primeiro presidente eleito através do voto direto desde o fim da ditadura militar, Fernando Collor de Mello, e uma enorme frustração oriunda do fracasso ao tentar controlar a inflação que atingira a impressionante marca de 1.784,84% ao ano ; as maiores emissoras de tv do Brasil veiculavam toda sorte de programas infantis e todo tipo de entretenimento de segunda a domingo, enquanto a seleção de futebol era desclassificada da copa do mundo da Itália pela Argentina.

Pelo mundo, o FMI impunha, à revelia das Nações Unidas, sua política e seus planos econômicos que tratavam de achatar, cada vez mais, os trabalhadores assalariados, principalmente os dos países não-desenvolvidos; além disso, iniciava-se a guerra do Golfo Pérsico entre Iraque (que invadira o Kuwait em meados 1990) e uma força aliada, comandada pelos EUA (que se tornara a potência hegemônica depois do colapso soviético)". (Continua...)

(Edson Santana é escritor, mestrando de Letras na Universidade Federal de Mato Grosso - edsonjosesantaana@gmail.com)

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