Posted by Anônimo Categories: Marcadores: , , ,

Os negros norte-americanos, enquanto laboravam nos campos de algodão, cantavam. As canções de trabalho (work songs) eram na verdade quase gritos vindo de plantações dos Estados do sul norte-americano.

A tristeza das melodias entoadas pelos escravos ajudou na elaboração do nome desse tipo de música: “The Blues”. É importante ressaltar que , além de significar “azul”, tal palavra também pode ser traduzida como “tristeza” e “melancolia”.

As letras do chamado Blues discorriam sobre vários temas, tinha tom irônico, bom humor, sensual idade mas, paradoxalmente, era melancólico. Por muitas vezes com temas religiosos e carregado de poesia, esse tipo de canto funcionava como uma válvula de escape para o sentimento de tristeza decorrente daquele tipo de existência encarcerada.

Entrementes, os negros escravizados no Brasil, nos raros momentos de lazer, batucavam e dançavam ao som do Lundu, ritmo africano nascido na Angola e no Congo . A dança era descrita na época como libidinosa e indecente.

Como o passar do tempo esse ritmo começou a misturar-se com outros ritmos mais populares entre os brancos, como o maxixe, e a ser acompanhado por violão. Por causa disso tornou-se mais popular e entrou nos salões de dança da época.

O Blues foi o elemento decisivo para o surgimento do rock, ritmo mais popular americano, assim como o Lundu foi essencial para o surgimento do nosso mundialmente popular Samba.

Com certeza uma das principais características em comum é que essas manifestações musicais foram maneiras de amenizar e até ‘racionalizar’ a condição de vida do trabalho escravo de um povo de cultura rica que veio a este novo continente para viver uma vida sub-humana.

Mas há outros pontos de ligação entre o bluesman e o sambista:

A figura do malandro no samba (olha que falo de malandro, gente bamba de verdade) é também muito parecida com a do bluesman: terno, gravata, chapéu, cabelo com gumex (tipo de ‘gel’ para cabelo), sapato bicolor brilhante, sorriso faceiro, dosagem alcoólica nem sempre bem controlada, fidelidade à vida boêmia, mas nem sempre a monogamia , gírias e vida dedicada à música que, apesar de suas particularidades, guardam muitas semelhanças em alguns temas:

  • Vida boêmia:

“My feet is sore /I can’t hardly wear my shoes / out last night, wild women /and it give me the big nigth blues” (Big Night Blues, Blind Lemon Jefferson)

“No dia em que apareci no mundo / juntou uma porção de vagabundo da orgia / de noite teve samba e batucada / que acabou na madrugada...” (Na batucada da vida , Ary Barrosso)

  • Mulheres:

“Now we played on the sofá / Now we played beside beside the wall / my needles have got rustly, baby / they Will not play at all” (Gramophone Blues, Robert Johnson – o gramofone como uma metáfora)

“Já tive mulheres de todas as cores / De várias idades de muitos amores / Com umas até certo tempo fiquei / Pra outras apenas um pouco me dei...” (Mulheres, Martinho da Vila)

  • Tristeza:

“When the train /rolled upthe station I looked her in the eye / well I was lonesome / and I could not help but cry / all my Love in vain...” (Love in vain, Robert Johnson)

“A luz negra de um destino cruel / Ilumina o teatro sem cor / onde estou desempenhando / o papel de palhaço do amor” (Luz negra, Nelson Cavaquinho)


Alguns vídeos de tristeza do Blues e do Samba:


Dark Was The Night, Cold Was the Ground

(incluida na sonda Voyager que foi ao espaço em 77)

Cazuza cantando Cartola


3 Comentario para Improváveis Conexões – Samba e Blues

31 de julho de 2009 às 09:00

Cara, muito bom esse artigo Carlos (ou Caio), muito "científico"! Com certeza, você foi muito feliz na comparação. De uns tempos pra cá também tenho pensado em algo nesse sentido, principalmente depois de ter me deparado com alguns documentos do século XIX (no meu exercício de historiador), encontrados no Arquivo Público de MT, em que constam um certo desconforto das autoridades da época, com as "batucadas" dos negros, escravos na época. Estas, na minha opinião, podem tanto ter sido formas de amenizar o "cativeiro", como também de auto-afirmação, individual, cultural ou mesmo de um grupo.

no mais, parabéns mais uma vez por socializar teu conhecimento conosco!

31 de julho de 2009 às 09:45

Excelente artigo mesmo!!!!

1 de agosto de 2009 às 13:36

Tirando o Cazuza, que é paia pacaraio, o artigo ficou lindo e maravilhoso!!!!! PRABÉNS, meu povo !!!

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